junho 05, 2014

Fresta

O que mais ela quer? Silêncio. Feche as janelas, tranque a porta - mas deixe a chave na fechadura. Não que ela queira sair assim, depressa. Mas é que pra ficar em silêncio tem que fechar esse nosso quarto por todos os buraquinhos: passa muito vento pela fresta da fechadura. E só depois então, com os corpos azeitados de silêncio, é que se pode começar a falar. Do quê? Do amor, do ódio irremediável, da ressaca, do silêncio. E, novamente, silêncio. O que fazem eles a não ser escutar? Sua mudez categórica me ronda, me perplexifica, e no vácuo em que digo as palavras, ecoam menos os verbetes do que o pulsar das artérias. E esse som bate nas paredes, ecoa nas janelas, na porta fechada - e não escapa por nenhum fresta. Novamente, silêncio. E ficamos ali, ouvindo a mudez orquestral do nosso corpo. 
E então, silêncio.

Nenhum comentário:

Postar um comentário