julho 19, 2013

Palavra, o Deus de Mercúrio

Palavra é pseudópode linguístico.
Vai Mercúrio, corre pra contar as boas-novas. De pés alados, num salto já está ali por entre os deuses, suspirando sonhos de nós, reles humanos. Conta. Mas, se for pra contar, conta tudo. Não me omita, e, ao contrário, me permita o acaso de dizer: Suas palavras não servem os deuses em nada. Corre no vazio, grita no silêncio, que ninguém te escuta lá em cima. Sim, porque palavra é só palavra. 
Articula o melhor que pode, mas tenha certeza que palavra é só palavra. Percebe que ela sempre aponta pra outra coisa que não é ela; palavra é sempre miragem. Tudo o que pode fazer é apontar, para cá, para lá. E, se já não te bastasse a falta de vocabulário, voce ainda me vem dizer que tem contigo a verdade dos afetos? INFAME! Te repito: palavra é só palavra.
Se, entretanto, ousar acreditar em mim, te convido a des-silabar e des-fonetizar teus verbetes, e verás, caro Mercúrio, que tuas palavras te apontam pra outro mar, bem longe da terra firme do discurso. Sim meu caro, porque palavra não é só palavra: é bússola. Então me faça o favor de parar sua rota interminável pelo céu, e olhar para onde vai. 
"Pra onde vão as palavras?" perguntaria o planeta desavisado, e já lhe digo: não vão a lugar nenhum: São seta, só apontam.
Se ainda quiser ir comigo proutro lado da tua lábia, então saiba disso: palavras são só miragem. Pronuncie-as como quem profetiza um destino: sim, porque palavra é só selo de carta que tá endereçada pra você mesmo. Desenvelope-a da fonética, dos trava-línguas e da dicção impecável do melhor orador do planeta, e então verás o que sobra dela: Uma seta.
Mercúrio, segue a seta como quem não quer nada, e verás; O discurso só discursa, o afeto sim é que afeta. Então faça um bem à humanidade, e pára de achar que em sua voz está o amor, a vida, a morte e a tensão de tudo aquilo que é humano; não, não está. Palavra é só palavra. O que se esconde no fundo dos desagravos, greves e desapegos da palavra é a sagrada alusão aos deuses, mas nunca os deuses em si. Desiluda-te de miragens, dispa-te do dicionário, e começa, sempre pé ante pé, a ver pra onde desembocam essas suas palavras.
Segue a estrela mais rápida no céu e ficará dando voltas em torno do próprio rabo. Sai da tua órbita; pára e vê pra onde é que esses seus pés alados te levam. Mergulha no rio no qual você só vê a própria imagem refletida e ali, Mercúrio, do outro lado, verá a verdade das palavras e dos afetos.
Mas, para não invalidar meu argumento, te relembro: tudo o que lhe disse é só discurso, porque o que quero dizer é indizível...

Um comentário:

  1. Não acredito q só hj tive o privilégio de conhecer este blog! Estou encantada!

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